segunda-feira, 14 de março de 2011

Ações de terremotos e outras ações dinâmicas em projetos estruturais no Brasil

Por: Ricardo Alvim

O estudo das ações dinâmicas decorrentes de terremotos, e suas consequências em estruturas civis, no Brasil é ainda alvo de poucas investigações, principalmente quando comparado ao restante do mundo. Primeiro, porque o Brasil encontra-se situado em uma região considerada estável sismologicamente, o que geram poucos históricos e dados para estudos. Segundo, porque ainda se investe pouco na formação de profissionais com esses conhecimentos nos cursos de engenharia brasileiros e, consequentemente, o tema ainda desperta pouco interesse na pesquisa acadêmica.

Por outro lado, acontecimentos sísmicos recentes, com abalos de pequena magnitude, registrados nas regiões centrais do país, e no nordeste, têm levado alguns pesquisadores a rever tais conceitos e procurar avaliar as condições das construções em geral no Brasil sob as condições dinâmicas de funcionamento, especialmente as de concreto armado pré-fabricadas e de alvenaria estrutural, tendo em vista o crescimento na utilização dessas estruturas no Brasil.
Mais do que isso, o estudo do comportamento dinâmico das estruturas permite não apenas projetar estruturas resistentes aos sismos, como também melhorar o projeto das estruturas para outras condições de solicitações dinâmicas, tendo como consequência a revisão de procedimentos de projeto e até mesmo as dimensões e detalhamentos.

O comportamento das estruturas sob ações de sismos ou outras solicitações dinâmicas, como ventos e carregamentos de veículos pesados (como caminhões e trens) é estudado no Brasil para o projeto de pontes e estruturas de edifícios altos. Em algumas situações de projeto, edifícios com mais de 4 pavimentos, sob determinadas condições de vento, por exemplo, o estudo dessas solicitações de natureza dinâmica é obrigatório, e dependendo das condições do projeto, essenciais, como no caso das ações de vento em edifícios altos; em geral no Brasil com mais de 20 pavimentos.

Isso torna muitas vezes o projeto mais caro e, por vezes, encontra por parte das construtoras resistências na aceitação de novas dimensões para os elementos estruturais típicos, especialmente os pilares, quando comparados aos elementos tradicionalmente encontrados nas estruturas existentes. Mas a consideração das ações horizontais devidas ao vento é obrigatória em prédios altos, e devem ser ativadas nas análises estruturais, geralmente feitas com apoio de recursos computacionais mais robustos em programas de análise específicos para o cálculo e detalhamento dessas estruturas.

Assistimos, na condição de projetista de estruturas e consultor há mais de 20 anos, por diversas vezes, projetos que falharam e apresentaram patologias graves porque simplesmente os recursos de análise de ventos eram desativados nos programas em uso, fato que conduz a redução nas dimensões das peças e na quantidade de armaduras.

De certa forma, as dimensões mínimas dos elementos estruturais sempre foi tema polêmico no Brasil. Há estudos que apontam, todavia, que a ideia de que as estruturas brasileiras de concreto armado possuem dimensões exageradas não passa de mito. E que estatisticamente estariam dentro de condições equivalentes ao que é praticado no restante do mundo. Mas isso não significa que o padrão estabelecido por estruturas construídas há mais de 40 anos devem ser únicos e pautar as referências dos projetos atuais, feitos com muito mais recursos computacionais à disposição.

O fato é que o Brasil ainda não experimentou um crescimento no número de construções de grande porte. Prédios altos, com mais de 500 metros, e pontes de grande comprimento ainda estão longe de alcançar, em número de obras e escala das construções, o que se verifica nos projetos de ponta pelo mundo afora. Por isso, as escolas de engenharia devem se antecipar e preparar uma nova geração de engenheiros capazes de enfrentar tais problemas, tendo em vista principalmente o período de ociosidade vivido pela engenharia brasileira nas décadas de 80 e 90. A retomada do crescimento certamente passará pelo enfrentamento de tais questões.



No que tange ao comportamento das estruturas não são admitidos danos por ações dinâmicas, fracas ou moderadas, que possam ocorrer com maior probabilidade durante o período de vida da estrutura. As normas impõem certas restrições, medidas nas relações com as respostas em regime elástico e sob cargas aplicadas estaticamente. Isso significa que os parâmetros de comparação são por vezes os deslocamentos máximos (amplitudes) alcançados sob condições dinâmicas de solicitação.

Dessa forma, o dimensionamento deve assegurar às estruturas características de rigidez e resistência de modo que, perante aquela ação, a resposta dinâmica global das estruturas seja essencialmente elástica. Nem sempre, todavia, isso é economicamente aceitável.

Com relação a estruturas sujeitas a sismos de grande intensidade, onde são aceitos alguns danos estruturais e, por conseguinte, que as respostas aconteçam em regime inelástico; nestas circunstâncias, a verificação da segurança se dá por critérios que assegurem uma baixa probabilidade de ruína, minimizando também suas consequências pela forma e velocidade do colapso em si (David Orlando Moreira Pinto).

A capacidade de uma estrutura em suportar um sismo intenso, ou outras ações dinâmicas intensas, sem colapso, está associada à formação de mecanismos de dissipação da energia. (No Japão, por exemplo, as casas em madeira são muito comuns, por causa da grande capacidade desse material em dissipar energias oriundas de sismos).

Nas estruturas em geral, a capacidade de dissipar energia se dá pela aptidão dos seus elementos, em ciclos de carga alternada, suportarem deformações para além dos seus limites elásticos, sem perda significativa de rigidez e resistência.

Esta aptidão é em geral designada por ductilidade inerente da estrutura e está não só associada às características dos diferentes tipos de sistemas materiais como também, e de forma muito importante, aos processos de dimensionamento sísmico das estruturas.

No caso dos grandes edifícios verifica-se a opção por sistemas mistos, de aço e concreto armado. O aço presente nas regiões mais altas das torres, formando parte do arcabouço resistente. E a presença do concreto armado, em maior reserva nas bases das torres, se dá não apenas por suas características estruturais óbvias, dada a capacidade de suporte de cargas de compressão, mas, sobretudo, consideradas as ações horizontais, ventos, e a possibilidade de sismos, onde o concreto atua como bom dissipador de energias transmitidas à estrutura por essas ações, permitindo economia de aço, usado apenas para suprir as deficiências do concreto simples à tração.

Isso ocorre porque o concreto fissura, permitindo criar por meio desse processo de microfissuração um sistema de amortecimento interno e de dissipação das energias acumuladas nos ciclos de carregamento dinâmicos impostos nas condições de operação das estruturas severas, com cargas de grande intensidade. 
Mecanismos normalizadores internacionais, como o Eurocode 8, prevêem exaustivamente as condições de projeto para essas situações, considerando as análises em regime não-linear. Contudo, as análises dinâmicas em regime não-linear não são ainda verificadas na prática corrente dos projetos de engenharia, em especial no Brasil, dada a sua complexidade, os custos e o tempo envolvidos.

Por isso, o dimensionamento das estruturas é habitualmente baseado na determinação da resposta elástica, sendo os resultados corrigidos por coeficientes de segurança, de modo a estimar os valores correspondentes a um regime não-linear.

Além disso, são prescritas diversas disposições construtivas para garantir um comportamento estrutural satisfatório em presença de ações sísmicas, ou dinâmicas de outra natureza, intensas, de modo a dotar as estruturas de resistência e ductilidade necessárias para assegurar que a dissipação de energia se processe de uma forma estável; por vezes conseguindo pelo uso de atuadores ativos ou passivos.

Igualmente necessário é garantir que o grau e a distribuição do dano estrutural não conduzam à ocorrência de colapsos globais ou locais; e que na sua iminência, isso se dê de forma “avisada”, isto é, permitindo apresentar elementos que denunciem tais estados comprometedores. O que pode ser obtido pelas avaliações do projeto em regime inelástico e, de forma mais simplificada, pela observância dos estados de fissuração sistemáticos do concreto armado, onde é possível verificar perdas acentuadas de rigidez efetiva das estruturas, que podem chegar a valores convergentes da ordem de até 20% da rigidez nominal.

Nessas condições, pesquisas de ponta têm sido feitas para permitir simular as condições operação das estruturas em condições mais realistas, em modelos em escala real (ver figura).


O Brasil ainda precisa se adiantar nesse tipo de pesquisa.  Ao longo das duas ultimas décadas, todavia, verifica-se um grande desenvolvimento das técnicas experimentais e dos métodos de análise estrutural em regime dinâmico no Brasil.

Ainda assim, outras questões encontram-se em aberto, sobretudo as que dizem respeito ao estudo das respostas sísmicas dos sistemas estruturais; a determinação das situações de iminente colapso, com a identificação dos mecanismos de dano e sua quantificação.

Na UESC, um grupo de pesquisadores, em parcerias com outros centros de pesquisa, tem procurado investigar o tema, em especial nos projetos de pontes ferroviárias, com parcerias com a UFPA - Universidade Federal do Pará, e alvenarias estruturais, com pesquisas com a UEFS - Universidade Estadual de Feira de Santana.


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